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BENEDITA DA SILVA

Qual a sua trajetória política?

Participei das lutas em minha comunidade, Chapéu Mangueira, criei o departamento feminino da Associação dos Moradores, ainda durante a ditadura e alfabetizei os moradores pelo método Paulo Freire. Em 1980 participei da fundação de Partido dos Trabalhadores. Fui eleita vereadora em 1982 e deputada federal constituinte em 1986. Reeleita deputada federal em 1990, disputei o segundo turno na eleição para prefeita do Rio em 1992. Dois anos depois fui eleita senadora da República e vice-governadora em 1998. Em 2002 assumi o governo do Estado para completar o mandato de Garotinho. Fui ainda ministra de Desenvolvimento Social do primeiro mandato de Lula e secretária estadual da mesma pasta no primeiro governo de Sérgio Cabral (2007-20010). Voltei à Câmara dos Deputados em 2010, me reelegendo em 2014.

Quais os maiores desafios que você consideraria vivenciar enquanto mulher na política? 

Não apenas na política, mas também na vida sofro o duplo preconceito, como mulher e como negra. A elite não aceita a nossa participação na vida política e faz de um tudo para dificultar ou mesmo impedir. Quando me tornei vereadora senti de imediato que o poder era branco e masculino. Em 1986 nem banheiro feminino existia na Câmara dos deputados pois não contavam com a participação da mulher.

 

Como você considera a sua realidade dentro do seu campo/grupo político?

Sou muito respeitada no interior do meu partido, mas isso não quer dizer que eu não perceba um certo preconceito machista por trás das declarações de boa intenções dos companheiros. Muitas militantes que não têm um espaço político reconhecido, como o meu, sentem dificuldades de crescer no interior do partido.

Você é ou já foi beneficiada por uma política afirmativa de gênero?

Não, construí a minha trajetória política e liderança na própria luta, mas defendo veementemente políticas afirmativas de gênero. 


Você contribui ou já contribuiu para construção de uma política afirmativa de gênero (partidária ou governamental)? Qual de que forma e como foi esse processo?

Quando fui governadora do Rio de Janeiro criei a Secretaria de Direitos Humanos com a política de cotas racial. Nomeamos várias mulheres e negros no 1º escalão do governo e sancionei lei cotas racial na Universidade Nacional do Rio de Janeiro.

Considera ser tratada de forma diferente por ser mulher?

Exijo para mim o mesmo respeito com que trato todas pessoas, independentemente de sexo, raça ou nacionalidade. Direito é direito.

Você acredita que a participação feminina na política é prejudicada? De que forma?

A participação feminina na política sofre vários tipos de bloqueios machistas e racistas, quando a mulher é negra. Esses bloqueios vão desde os preconceitos do machismo até as dificuldades de ordem cultural, financeira e mesmo familiar, quando  sobra apenas para a mulher a criação dos filhos.

Você considera a criação dos filhos conciliável com a vida profissional do trabalhador? Com a vida pública? De que forma?

Claro que sim! E digo mais: a amplitude disso poderia ser muito maior se houvesse a colaboração dos maridos e/ou pais, bem como uma estrutura de creches públicas que atendesse a quem precisasse trabalhar ou participar da representação política.  

O que você diria para uma mulher que quer ingressar na política?

Daria o maior estímulo, mesmo que não fosse do meu partido. Que não deixem de realizar os seus sonhos, que não desistam nunca e resistam às intempéries.

Se pudesse, o que você diria a você mesma, quando entrou na política?

Deveria ter entrado a mais tempo e, entre outras mulheres, ainda sou minoria na representação popular e negritude. Não achava que fosse tão difícil, mas vou vencer mais esse desafio em minha vida. E venci!


O que você considera uma característica essencial para uma mulher na política?

Pensar e agir por conta própria, seguindo apenas seus princípios e o programa de seu partido. Claro que prefiro que as mulheres usem toda a sua coragem, determinação e sensibilidade a serviço das causas sociais, mas reconheço que o campo da direita também produziu líderes mulheres com personalidade muito forte.

 

Você observa diferenças no fazer político feminino, se comparado ao masculino? Se sim, quais? 

Sim. Os objetivos podem ser os mesmos, mas a forma de olhar o problema e especialmente de nele considerar o papel da mulher se diferencia muito da visão masculina.

Certa vez, ouvi de uma política que ela sentia faltar repertório para as mulheres para lidar com o processo da vivência política. Você concorda? Porque?

Como a política sempre foi historicamente feita pelos homens,  as mulheres têm que desenvolver o seu repertório à medida do aumento de sua participação. Ele não nasce pronto, pois é produzido por esse processo de vivência da mulheres na política. A militância política nos empodera.

 

O que você considera que a mulher não pode perder ao entrar na política?

Sua sensibilidade para ver a situação do mais fraco e do sem direitos, pois ela viveu muito tempo nessa condição e sabe como isso aprisiona.

O que você considera necessário ser feito para que a luta das mulheres não seja uma mera instrumentalização?

Que a luta das mulheres seja delas próprias, impulsionada por sua própria consciência feminista e organização.

Qual o fator que você considera ser decisivo para a baixa participação da mulher na vida pública? 

1) Discriminação racial da mulher negra.

2) Discriminação econômica de gênero

3) Ideologia machista e todo o seu elenco de violência doméstica e contra a mulher.

4) A ideia machista de que política é coisa de homem.

5) Divisão de tarefas

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